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SebastiAn Zuccardi: “Eu não decido, deixo a natureza me levar”

22/12/2020 No Comments

“As vinícolas familiares vão para o céu ou inferno”

“Elas podem ser o céu ou o inferno, todo depende da sua legítima vocação. Quando você tem liberdade de escolha e paixão, é o céu, mas pode virar o inferno, caso sua carreira se transforme apenas em uma obrigação e mandato familiar. As empresas familiares são uma peça chave no mundo do vinho, porque, em geral, elas estão relacionadas a uma região, e além disso, trabalham com um fator muito importante: O tempo. Os processos do vinho levam tempo. Cada vinícola familiar precisa ter um olhar de amor pelo lugar e uma dimensão do tempo a longo prazo. Nós, não enxergamos a nossa empresa apenas como uma questão de rentabilidade, claro que isso é uma condição, porém, quando plantamos algum vinhedo, não ficamos pensando no retorno do dinheiro, primeiro que todo, acreditamos no lugar e focamos no nosso sonho”.

“Estamos construindo o significado do lugar”

“A nossa geração é o resultado da imigração e de gerações de viticultores que foram plantando, replantando, escolhendo, cultivando, melhorando, por exemplo, vejam o Malbec; então, nós precisamos estar cientes que outras gerações nos marcaram um caminho. E o nosso trabalho será a base do futuro, tijolo a tijolo, para uma próxima geração. Eu sou um cara otimista! Aliás, você não pode fazer agricultura sem otimismo. O que está por vir seguirá no caminho do crescimento. Percebo dois desafios principais: Primeiro, nós precisamos  entender e conhecer bem as nossas regiões, é um trabalho que estamos fazendo hoje, de estudar, andar, aprender, confirmar, e em ser confiantes, porque existem lugares na Argentina com um baita potencial para fazer vinhos no melhor nível do mundo. O outro desafio é contar o que a gente faz. Sair a evangelizar sobre a magia dos lugares onde cultivamos, contar ao mundo a história, a cultura, e a qualidade de viticultores que existe  hoje. Estamos fazendo um trabalho em conjunto, junto a meus colegas, como uma construção do significado do lugar”…

“Espero que a próxima geração tenha um espaço de liberdade”

“Pelo fato do vinho ser produzido ao ar livre, por depender da natureza, existe um fator de muito trabalho, intensidade e obediência da natureza. A gente não decide o que faz, eu me integro à natureza, deixo a natureza me levar… Por isso, é necessária uma grande vocação. Eu cultivo vinhedos que plantou meu avô e meu pai (Alberto Zuccardi) e hoje estou plantando para a próxima geração. Como visualizo o futuro? O mais importante é que eles se apaixonem pelo lugar onde vivemos, pelo que fazemos, e tenham a confiança e a energia para dar continuidade. Eu tive liberdade, fiz uma escolha, e hoje sinto que foi uma das mais importantes da minha vida. Espero que a próxima geração tenha esse espaço de liberdade, sabendo que quanto mais você trabalha para o vinho, você mais irá receber do vinho em troca, muito mais”.

“O projeto Cara Sur é um resgate do esquecimento”

“Nesse novo empreendimento nós buscamos resgatar histórias: A de uma região esquecida pela vitivinicultura argentina (El Barreal, Vale de Calingasta, San Juan) localizada entre a Pre-Cordilheira e a Cordilheira frontal, e mais isolada de Mendoza e San Juan. Nesse resgate, também estão as variedades autóctones. Queremos dar visibilidade para os vinhedos antigos, de mais de oitenta anos, e com cepas criollas, que no passado foram maltratadas, e que, na minha visão, elas formam parte da história da nossa vitivinicultura. O objetivo com Cara Sur é a busca de uma identidade”.

“A Cordilheira determina a identidade dos nossos vinhos”

“Os nossos vinhos são de montanha, e considero que é a Cordilheira dos Andes é quem determina a identidade dos vinhos. Ela nos isola do oceano, nos faz cultivar em um deserto em altura, e a altura nos permite cultivar em zonas mais frias, porém, em zonas com luz, porque ao estar mais perto do sol e ter um clima seco, a pureza lumínica é grande. Quando no mundo se pensa em zonas frias, você pode imaginar um clima nublado e chuvoso, mas aqui, perto dos Andes, as zonas frias tem luz!. A Cordilheira também nos brinda água, que utilizamos para regar, porque vivemos em um deserto onde senão regamos não podemos cultivar. E a água que usamos chega do desgelo da Cordilheira. Ela também nos dá os solos. A sua diversidade geológica origina diferentes solos, que são de origem aluvional. Há milhões de anos tivemos grandes glaciares na montanha, e depois, no derretimento  desses glaciares, se arrasta o material, e por tal motivo os solos que andamos e onde nossas raízes crescem, se formaram na Cordilheira”.

“O vinho é uma baita de uma rede social”

“O importante é mostrar o vinho como ele é, a expressão de um lugar, e apresentar não apenas como um líquido, mas como uma bebida prazerosa que nos faz viajar e aprender sobre  lugares. É obrigação associar   o vinho ao prazer antes do que algo complexo. Para apreciar um vinho não precisamos conhecer sobre o tema, simplesmente, abri-lo e experimentá-lo com sentimento, desfrutá-lo. O vinho é uma síntese da história e cultura de um lugar e as características da região. É subjetivo pensar sobre qual é o melhor vinho. Uma bela garrafa produz um momento mágico, único, dependendo do momento, do estado de ânimo e da companhia. Acredito que o vinho é  uma baita de uma rede social, a melhor de todas!. O degustamos, falamos uns três minutos sobre ele, e logo depois esse vinho nos abre histórias… Deveria contar a história do lugar onde se produz, a sua paisagem, seu clima, o solo, onde a altura é um fator determinante, mas não o único. Contar a história das pessoas daquele lugar, sua viticultura, produtores, e o ano de produção, que cada ano são diferentes pelo clima, e pelo novo olhar do produtor que evoluciona. Quando juntamos todas essas histórias, percebemos que não existem dois vinhos iguais”.

Diego Graciano

Jornalista e sommelier.

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