Por quais motivos o Vale do Uco, em Mendoza, é considerada uma das regiões vitivinícolas mais admiradas pelos enólogos e pelos amantes do vinho? Alguns especialistas explicam para Vinhosargentinos detalhes de quatro sub-regiões de altura, que, segundo eles, aportam ao vinho características de texturas marcantes, sensações de frescor e salinidade, entre outros aromas intensos.
Na visão do experiente viticultor Pedro Marchevsky, com o sucesso das vinícolas argentinas nos mercados internacionais nos finais dos anos 90 e começos do 2000, “os produtores saíram na procura de novos lugares com maior altitude, e um deles era Gualtallary, de solos diferentes e a existência de rego por gotejamento, que permitia irrigá-los com economia e eficiência”. Para o reconhecido enólogo Edgardo del Popolo, “Gualtallary é um lugar único e especial, com um terroir privilegiado para o cultivo do Malbec. Após anos trabalhando nessa região, ainda me surpreendo com a qualidade dessa cepa que hoje nos representa no mundo” afirma.
Martin Kaiser, enólogo da vinícola Doña Paula, brinda uma aula para Vinhosargentinos sobre Gualtallary. “É uma pequena seção dentro de um grande Vale, mas sem tradição vitivinícola, há trinta anos só tinha cria de gado bovino. Localizado ao pé da Cordilheira dos Andes, estamos no frio e na altura, a uns 1.350 metros sobre o nível do mar. Por conta da altura é um dos lugares mais apreciados pelos enólogos para fazer vinhos de alta gama” explica Martin, enquanto anda pelos vinhedos. “Temos solos muito pedregosos e calcários, e em outros setores, sem calcário e mais arenosos. Por causa do solo pedregoso, as plantas sofrem com a falta de água durante o ciclo vegetativo. Esse processo faz muito bem para a maturação das plantas, que ficam bem mais concentradas” afirma o pesquisador.
Paraje Altamira é uma sub-região localizada ao sul do Vale do Uco, em San Carlos, município de La Consulta. Para o enólogo Juan Suarez, Altamira “possui uma bela história, com plantas antigas de até cem anos, onde trabalham algumas famílias, como a minha, há quatro gerações. O meu filho Pedro já é quinta geração. Em 2021, nós, da família Suarez, celebraremos cem anos em Altamira” afirma orgulhoso. “A partir de 2013, Altamira foi eleita a primeira indicação geográfica (IG) delimitada por limites técnicos de solos e clima, e não por limites políticos, como acontece na maioria das IG da Argentina” informa Juan a vinhosargentinos, enquanto mostra pedras e produz um rigoroso depoimento, do lado da montanha e a uns 1.100 metros de altura.
“Neste clima continental, a irradiação solar e as noites mais frias resultam em uvas com ótima maturação. O ideal é que não se queimem com o sol, assim dá para obter frutas frescas e maduras ao mesmo tempo, isso, para mim, é uma das chaves de Paraje Altamira – continua o viticultor – Há milhões de anos, o rio Tunuyan formou solos de origem aluvial. Esse solo contém pedras redondas pelo movimento da água e o conteúdo de carbonato de cálcio, que foi transformando-se por tempos geológicos. Tudo isso, dá uma característica muito marcante na textura dos vinhos, como uma salinidade e sensação de frescor, uma marca registrada de Paraje Altamira e da Finca Suarez” completa o enólogo.
El Cepillo encontra-se ao sul de San Carlos, entre 1.000 e 1.100 metros de altura, também reconhecida como nova IG, e chamada pelos produtores como “zona geladeira”, pelo fato de ser muito fria. O jovem winemaker Sebastian Bisole, de Paso a Paso Wines, aponta que o terroir traz “uma particularidade nas características do vinho: Em nariz, se percebe uma alta intensidade floral, e em variedades como o Malbec, se sente muita fruta fresca em comparação a outras regiões. Os solos possuem uma heterogeneidade bastante importante, sem a mesma proporção de pedra dos vizinhos de Altamira, mas vemos argila e limo. Aqui colhemos, dentro outras, uma Bonarda de um vinhedo de mais de oitenta e cinco anos. De ciclo tardio, ela oferece baixos rendimentos pelo frio, mas concentrações muito altas. Por isso, a Bonarda do Vale de Uco é muito mais floral ou com aromas de frutas mais frescas que outras zonas de Mendoza” assegura Sebastian, sobre a região que hoje trabalham uns vinte produtores, com predominância do Malbec.
Garman Masera, enólogo de Escala Humana Wines, é mais um jovem enólogo argentino inovador que sonha e produz vinhos de grande identidade. Ele acaba de apostar no Vale de La Carrera, município de Tupungato. “Formo parte de um grupo de pequenos produtores aventureiros que sonhamos em desenvolver esse lugar. Hoje estamos estudando e aprendendo a conhecer La Carrera, porque aqui não há antecedentes nem estatísticas, é tudo novo para nós, isso nos traz ilusão! Nessa região se plantaram batatas, ervilhas, mas nunca uvas, não há história vitivinícola” conta Germán a Vinhosargentinos. “Estamos entre os 1600/1700 a 2000/2200 metros de altura. Existe um volume de chuvas alto, então acreditamos que não vamos ter que regar. Pesquisamos tudo, além de estudos sobre amplitudes térmicas. É um lugar difícil, desafiante, com geladas antecipadas e tardias. Pensamos que as mudanças climáticas nos ajudarão a encontrar vinhos com personalidade única e autêntica. Há uma condição incrível de solos, clima e paisagens. La Carrera é mágica”.
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